Os altos e baixos do autismo


Apesar de não olhar nos olhos e apresentar uma pequena dificuldade de dicção, Melissa, de 9 anos, interage muito bem e não tem problemas com o contato físico, diferente do que acontece comumente em pessoas com autismo. Mas, mesmo assim, a notícia de que ela faria parte de sua turma no Guri não foi tão simples para Rogério, educador do Polo Regional Sorocaba. “Assim que soube que a Melissa tinha se inscrito para aula de percussão, procurei pesquisar sobre o autismo, por ainda ter certo receio e algumas dúvidas. Aproximei-me também da Sra. Gilsi, sua mãe, que me ajudou inicialmente em sua adaptação, fazendo a Melissa se sentir mais segura, e me mostrou como lidar com seu comportamento”, comenta.melissa e rogério - sorocaba

Antes de entrar para percussão, Melissa já havia estudado musicalização e canto coral no Guri. Seu primeiro contato com o novo curso ocorreu em um momento de transição, quando ela havia completado 8 anos de idade e iria escolher um instrumento para dar continuidade aos estudos de música. “Ela entrou na sala, tirou a baqueta da mão de um aluno e bateu em todos os instrumentos. Tentei falar com ela, mas não houve comunicação. Após isso, ela teve um pequeno surto e saiu da sala. Fiquei preocupado, pensando em como seria tê-la em minhas aulas a partir dali”, conta Rogério.

Com um novo desafio em mãos, o educador optou por dividir o desenvolvimento da aluna em três fases: primeiro tendo a companhia da mãe durante as aulas; depois retirando a presença da mãe; e, por fim, transferindo Melissa para um nível mais avançado, além de ingressá-la na banda do polo.

Num primeiro momento, a aluna foi apresentada à turma, ao estilo das aulas e aos diversos instrumentos novos disponíveis ali. “Para mim, foi o período em que pude identificar a forma como ela se comportava, as coisas que a incomodavam e os instrumentos que ela mais gostava. De cara, ela não se interessava em estudar todos os instrumentos propostos para a turma, mas com um pouco de insistência isso foi melhorando. Hoje ela toca quase todos”, relata o educador.

Passado o primeiro semestre, que foi de grande valia para o aprofundamento de detalhes sobre o autismo e quais dinâmicas poderiam se adequar a este tipo de deficiência, Rogério decidiu passar Melissa para a turma B, solicitando à Sra. Gilsi que ficasse fora da sala de aula, para um teste. “Essa mudança foi determinante, pois, a partir de então, tudo era conversado diretamente comigo, fazendo com que a nossa comunicação e com os colegas da turma melhorasse muito”, afirma Rogério.

Outro fator importante para o educador, além da adaptação de Melissa, era justamente a adaptação do restante da turma a ela. E neste quesito, ele não teve muito de se preocupar, pelo menos com sua primeira turma. Todos sempre a trataram com muito respeito e até entravam em suas brincadeiras, como forma de incluí-la.melissa e prof.

Recentemente, Melissa participou de uma apresentação na Câmara Municipal de Sorocaba, onde ela realizou o solo de uma música no metalofone (seu instrumento predileto). “Ela errou, continuou tocando, contornou o erro e prosseguiu com o arranjo, demonstrando muita musicalidade e “jogo de cintura” em um evento formal”, ressalta Rogério.

Faz mais de dois anos que a Melissa entrou no Guri e ainda há muito para se aprender. Nem sempre será fácil, nem sempre o comportamento será o mesmo, mas uma coisa é certa: o tempo ajuda, e muito, no aprendizado diário. “Já estou pronto para novos desafios e assim pretendo seguir”, conclui nosso empenhado educador.

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